quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Morte em um parágrafo


Não há chance. A cada lance da escada a dor no peito aumenta. O esforço hercúleo parece ao contrário do que poderia se imaginar, muito menos heróico e muito mais humilhante à medida que os instantes passam. Sua face adquire uma expressão de dor lasciva, seus olhos que saltam as órbitas buscam qualquer coisa no vazio, uma última esperança, uma salvação milagrosa, mas nada surge. Seu peito inflama em uma dor tão forte que seus joelhos fraquejam e batem no chão, junto vem seu corpo mais pesado do que nunca, e um baque marca a queda inevitável. Cai de barriga para baixo, rosto espremido contra o carpete sujo, a respiração ofegante lhe traz como derradeira lembrança o cheiro forte do mofo. Nos seus olhos o desespero da luta pela vida, as pupilas de um animal acuado. Já não há mais esperança quando seus músculos se retesam num último impulso nervoso. Diante de seus olhos não passa nenhum filme de lembranças, somente a visão de uma sombra que lhe toma a vista pelos cantos, até restar um último ponto de luz que se esvai. Está morto agora e sua carcaça resvala sem vida ao chão.
Logo após surge atrás dele o socorro tardio, alguém que passava por ali tropeçou em algo no corredor escuro e notou que se tratava de um homem, ou melhor, de um corpo. O laudo da autópsia indicava infarto.

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